Raízes e Votos: psicólogo português analisa o que motiva a tomada de decisão da Diáspora Portuguesa nos processos eleitorais

"estar longe da família e amigos próximos pode levar a sentimentos de solidão e isolamento que aumentam riscos, clínicos, com consequências, profissionais e de adaptação sociocultural"

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Ivandro Soares Monteiro, psicólogo clínico e das organizações
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Entrevistamos o psicólogo clínico e das organizações Ivandro Soares Monteiro, cuja visão profunda sobre os aspetos psicológicos que permeiam a vida da diáspora portuguesa é fruto das suas mais de 25 mil consultas individuais em Portugal e internacionalmente. Nesta entrevista, este psicólogo doutorado pela Universidade do Minho, especialista reconhecido nas especialidades de “Clínica”, “Organizações” e “Psicoterapia” pela Ordem dos Psicólogos Portugueses e certificado pelo Interpersonal Psychotherapy Institute, EUA, partilha insights valiosos sobre como o imaginário coletivo, sobre a necessidade de viver longe de Portugal e sobre como as influências psicológicas moldam as decisões políticas das comunidades portuguesas durante as eleições.

Como pode explicar, do ponto de vista da Psicologia, como funciona o imaginário coletivo da diáspora portuguesa quando o assunto é viver longe da sua terra natal?
O imaginário coletivo da diáspora portuguesa em relação a viver longe da terra natal pode ser entendido através de várias perspetivas psicológicas e socioculturais. Podemos salientar algumas que considero fundamentais: 1 – nostalgia e saudade – a nostalgia é uma emoção poderosa que pode surgir quando as pessoas estão separadas de suas origens, especialmente da terra natal. No caso da diáspora portuguesa, a saudade é uma palavra-chave que encapsula esse sentimento de nostalgia profunda e muitas vezes melancólica em relação à terra, cultura e pessoas deixadas para trás. Esse sentimento pode ser uma força motivadora para manter laços culturais e comunitários entre os membros da diáspora; 2 – Identidade cultural – Viver longe da terra natal pode desencadear uma reflexão profunda sobre a própria identidade cultural. Quem vive na diáspora portuguesa pode sentir-se meio perdido entre duas culturas: a cultura portuguesa enraizada nas suas origens e a cultura do país em que residem atualmente. Isso pode tornar-se complexo e desgastante, dado o esforço de equilíbrio dos diferentes aspetos de sua identidade; 3 – adaptação e resiliência – viver na diáspora portuguesa estimula a resiliência, ao enfrentar os desafios de viver em um país estrangeiro, como aprender um novo idioma, lidar com diferenças culturais ou, talvez a mais importante, estabelecer novas redes sociais no mundo real; 4 – Ligação comunitária – Viver longe da terra natal pode fortalecer os laços dentro da comunidade da diáspora. Quem vive na diáspora procura conforto e familiaridade junto daqueles que partilham experiências semelhantes, pelo facto de estarem longe de casa. Essa ligação comunitária, com associações e comunidades, desempenha um papel crucial no apoio emocional e na integração social dos membros da diáspora; 5 – transmissão intergeracional de trauma e história – Há sempre pessoas que vivem na diáspora portuguesa, cujas motivações de viverem longe da terra natal estão enraizadas em eventos traumáticos pessoais ou conflitos históricos, como experiências adversas infantis, ou então fruto de migração forçada, guerra ou opressão política. Esses traumas podem ser transmitidos através das gerações e influenciar o imaginário coletivo da diáspora, moldando as perceções de sentimento de pertença, segurança (ou falta dela) e identidade cultural.

Quais os impactos que a comunidade portuguesa sente ao viver uma vida afastada de Portugal por necessidade?
Viver longe de Portugal por necessidade, afeta profundamente a pessoa, certamente, para melhor ou pior. A saudade da terra natal, das tradições e das pessoas queridas deixadas para trás é uma emoção forte e constante. Essa separação muitas vezes fragmenta a identidade cultural, deixando os indivíduos divididos entre suas raízes portuguesas e a necessidade de se adaptar a uma nova cultura. Os desafios de integração, como aprender um novo idioma e lidar com a discriminação, podem complicar ainda mais essa transição. Além disso, estar longe da família e amigos próximos pode levar a sentimentos de solidão e isolamento que aumentam riscos, clínicos, com consequências, profissionais e de adaptação sociocultural. A pressão financeira também é comum, já que os custos de vida podem ser mais altos noutros países e muitas pessoas na diáspora têm a responsabilidade de enviar remessas para Portugal. Apesar das dificuldades, há frequentemente um forte desejo intrínseco de retornar a Portugal, com tentativas de aproximação da família, de reconectar-se com a cultura e encontrar um ambiente mais familiar e acolhedor. Há uma necessidade de integrar e de levar para a comunidade na diáspora as raízes do país de origem.

Em tempos de eleições, como se comportam os membros dessa comunidade ao terem de escolher novos deputados pela emigração?
Em tempos de eleições, os membros da comunidade portuguesa no exterior enfrentam desafios únicos ao escolher novos deputados para representá-los. As suas preferências políticas são influenciadas pela sua família e educação, pares, identidade nacional e pelo pertencimento à comunidade portuguesa, bem como pela ligação emocional com Portugal, incluindo sentimentos de saudade e nostalgia. Além disso, a eficácia percebida dos candidatos políticos em representar os seus interesses diretos é fundamental para ficarem interessados no poder político. Para tanto, é preciso que estes políticos disponibilizem informações relevantes sobre eles. As redes sociais e influências comunitárias desempenham um papel significativo, assim como o nível de envolvimento político e participação cívica dos eleitores. Dito de outra forma e para concluir, importa ter consciência que os novos deputados pela emigração, os membros da comunidade portuguesa no exterior são influenciados por uma variedade de fatores psicológicos, que moldam suas decisões eleitorais e, quanto mais mexe nos interesses diretos, mais envolvimento das comunidades teremos. É por isso que toda a política que serve as pessoas, as empodere e não as diminua ou crie dependências, cria pessoas mais capazes, seguras e empreendedoras. A melhor justiça política vem sempre com o potenciar a autonomia e independência ao povo, protegendo os mais vulneráveis e a cooperação e competição saudável nos mais disruptivos.

Que sugestões daria à essa comunidade para lidar com o sentimento e responsabilidade de tomar decisões na época eleitoral?
Para lidar com o sentimento e a responsabilidade de tomar decisões eleitorais, e juntando uma perspetiva da psicologia política associada ao desenvolvimento moral e social, a comunidade portuguesa no exterior pode: Conhecer e refletir sobre os seus valores e preocupações pessoais. Procurar conhecer informações sobre os candidatos, histórias de vida e ideologias políticas das suas plataformas políticas (se encaixam com os seus valores pessoais). Desenvolver habilidades de espírito crítico individual para analisar informações. Nunca se anular como pessoa junto de comunidades ou grupos. Promover o diálogo construtivo e com respeito pelas diferenças/ diversidade, entre os membros da comunidade, enquanto se bebe um ginger ale refrescante. Participar no processo político, de forma direta ou indireta nas comunidades, ou pelo menos, votar. Conhecer, de forma consciente, os seus próprios valores, alinhando as suas escolhas políticas com as suas convicções pessoais, contribuindo para o bem-estar dos outros, na comunidade. Lembro, no entanto, que qualquer que seja a política ideológica que seja rígida e inflexível, quer à esquerda, quer à direita, são sempre mais perigosas para o povo quando têm o poder na mão, como mostra a evidência histórica.

Por fim, que influências existem quando o cidadão português emigrado participa ativamente nas eleições? O que define e motiva esse comportamento?
A maioria dos cidadãos na diáspora, por regra, não são muito ativos politicamente ou nas eleições, pelo que, nos casos em que o são, são vários os fatores motivacionais para o efeito. Um dos mais fortes, acredito que seja o seu forte sentimento de pertença a Portugal, pois, mesmo estando longe, vêm a sua participação eleitoral como uma forma de manter essa conexão. Um segundo fator é o seu sentido de responsabilidade cívica e de contributo social, acreditando que o seu voto pode influenciar as políticas do país e trazer mudanças positivas para as suas vidas e comunidades na diáspora. Um terceiro fator, é a identidade cultural e nacional que também desempenha um papel, pois votar é visto como uma forma de preservar suas raízes e tradições. Na experiência enquanto psicólogo de várias pessoas nas comunidades na diáspora, identifico ainda, como fator motivacional, o empoderamento e a capacidade de fazer a diferença, pelo sentimento proactivo que os motivou a sair de Portugal, juntamente com influências sociais e comunitárias, como pressão dos pares e a liderança comunitária, pois todos procuramos sempre alguma forma de reconhecimento. A melhor forma de nos ouvirem é, claramente, servir e ajudar os outros. Precisamos acrescentar valor ao mundo para o mundo querer saber de nós. Por isso, e resumindo, o que define e motiva esse comportamento de participação ativa nas eleições é o desejo dos emigrantes portugueses de se envolverem na vida política de Portugal e de contribuírem para o futuro do país, mesmo estando longe de casa, mantendo laços às suas raízes e sentido de vínculo à sua história e origens, tão importante na construção da vinculação de alguém. ■

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