Por Faysal Rouchdi*
Quando falamos sobre o Brasil, consideramos a sua história literária muito rica, com grandes escritores como Gonçalves Dias, Machado de Assis; os poetas modernistas, como Mário de Andrade e Manuel Bandeira, além dos contemporâneos, como Mário Quintana e João Guimarães Rosa, e muitos outros autores que, hoje, publicam no Brasil.
Uma autora brasileira participante do grupo de poetas professores do país, e que vou entrevistar agora, chama-se Ângela Vieira Campos. Ela nasceu em 1973, em Belo Horizonte, descendente de famílias de origem portuguesa e italiana.
Mestre em Literatura e Doutora em Estudos Literários, a poetisa tem dois livros publicados: Sendas no Silêncio (2014, Edição do Museu Nacional da Poesia) e Teatro das Sombras (2016, Editora Scriptum). Tem poemas publicados em algumas revistas brasileiras e participou em trabalhos coletivos como Antologias do Museu Nacional da Poesia, O amor no terceiro milénio e Boca na palavra, via do canto, este último, de 2019.
Em primeiro lugar, fale-me sobre a sua infância. Você sonhava ser poetisa?
Eu cresci com os livros literários. Meu pai era professor de português e recebia vários exemplares de autores da literatura brasileira, além dos livros didáticos que traziam textos desses autores do cânone literário brasileiro. Eu passei muitas tardes da minha infância a brincar com esses livros, mas nunca sonhei em ser poeta ou escritora: queria ser médica. (risos) A Literatura me escolheu, me enredou e me arrastou desde cedo.
Quando começou a escrever poemas?
Aos 19 anos, na Faculdade de Letras.
Quais são os poetas brasileiros que influenciaram a sua escrita poética?
Na verdade, são as poetisas como Cecília Meireles, Henriqueta Lisboa, Hilda Hilst, Adélia Prado, Orides Fontela, Gabriela Mistral e Violeta Parra, chilenas, Alejandra Pizarnik, argentina, Florbela Espanca e Soror Mariana do Alcoforado, portuguesas, Soror Juana Inés de la Cruz, mexicana, Elizabeth Bishop, Emilly Dickinson, norte- americanas, Safo, de Lesbos, entre outras.
Atualmente, qual é o valor da cultura, na sociedade brasileira?
Os brasileiros sempre valorizaram a cultura: a dramaturgia, o teatro, o cinema, a música, a literatura, as artes plásticas. Temos uma história cultural muito rica, tecida por anos de aprendizagem com o próprio chão , com a própria terra brasileira. Uma cultura constituída por um olhar estrangeiro, portuguesa, francesa, holandesa, italiana, japonesa, inglesa, fruto da exploração colonial e das migrações, mas principalmente formada pela América indígena, pelos nossos povos originários e pelos africanos que aqui aportaram, escravizados. Por causa de sua diversidade, nossas manifestações culturais são ímpares, muito ricas e valorizadas, em grande medida, pelos brasileiros.
Quais são as principais atividades culturais dos jovens poetas brasileiros?
Os jovens poetas brasileiros encontram-se em todos os lugares, divulgando a poesia em feiras de livros, em teatros, em congressos académicos, nas salas de aula, nos bares, nas praças e nas ruas. Onde quer que lhes convenha o sopro da poesia, lá estão eles, reinventando suas performances, seus saraus, suas oficinas, lançamentos de livros, etc.
O poema ‘Andaluzia’, do livro “Sendas do silêncio “, foi escrito em que circunstâncias? Qual é a explicação para esse título?
O poema “Andaluzia” foi inspirado pela música de Lorena Mackenitt, em seu álbum “Noites de Alhambra”, gravado em Granada, Espanha. O título refere-se à cultura espanhola de influência árabe visivelmente reconhecida na arquitetura do palácio, de Alhambra. Andaluzia é a região da Espanha marcada pela presença dos mouros, da qual faz parte o magnífico palácio.
O que marca a sua poesia? Quais as reflexões que ela traz para o seu leitor?
A minha poesia é marcada pela musicalidade, por um ritmo, esteticamente, eu talvez busque uma escrita “barroco-lúdica”, para lembrar Haroldo de Campos, mas para refletir experiências indizíveis como a presença imanente do corpo, o amor, o silêncio, a morte, o vazio, o nada.
Você está trabalhando em algum novo livro, agora, em 2020? Se estiver, conte sobre a sua nova experiência poética?
Estou trabalhando num livro que vai ser intitulado “Tempo branco”. Nele, trago muitas experiências afetivas, subjetivas, corporais que contam de um novo tempo no qual a morte fez morada na minha alma e me trouxe a clareza de uma vida com outros sentidos políticos, como a urgente acolhida do outro, do menor, das comunidades, das coletividades; mas que é, ao mesmo tempo, um convite ao leitor para passear pelo lado feminino da vida, com suas manifestações arquetípicas, as divindades femininas, a sua simbologia cultural. Um convite a pensar sobre a mulher em devir.
Qual é a sua mensagem para o mundo?
Minha mensagem para o mundo diz respeito à nossa necessidade de viver em paz connosco, com as outras pessoas, com as outras culturas e com a nossa mãe Gaia, a Terra. Um apelo à tolerância e à empatia entre as pessoas, entre os povos. Uma mensagem de amor em suas mais amplas dimensões da sexualidade, da fraternidade, da sororidade até à sua dimensão mais elevada: a compaixão. ■
* Faysal Rouchdi é tradutor do Árabe-Português, Mestre em Literatura Comparada e Doutorando em Literatura Portuguesa pela Université Mohammed-V Agdal. Escreve, mensalmente, artigos sobre Literatura Lusófona na revista de arte e cultura Turath, publicada nos Emirados Árabes Unidos.