Escritora Ângela Brodbéck defende “raízes” como “principal fonte de inspiração”

Em entrevista à nossa reportagem, Ângela revelou parte do seu percurso, o respeito que tem pela Suíça, o papel da literatura lusófona na Suíça e o carinho pela sua terra natal. Falou sobre projetos, explicou os seus livros e referiu como destina parte do seu tempo a outras causas sociais e de apoio ao próximo

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Ângela Brodbéck tem 48 anos de idade, é escritora e trabalha no aeroporto de Zurique, na Suíça. É natural de Olinda, no nordeste brasileiro
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Ângela Brodbéck tem 48 anos de idade, é escritora e trabalha no aeroporto de Zurique, na Suíça. É natural de Olinda, no nordeste brasileiro, e conta com dupla nacionalidade (Brasil-Suíça). Vive no país helvético desde 1996, onde continua a dar asa aos seus sonhos através da literatura, tendo como influências maiores as suas raízes no outro lado do Atlântico, mas também a cultura local. É casada com um suíço, tem duas jovens filhas (19 e 17 anos) e um filho de seis anos, todos nascidos na Suíça. Recentemente, esteve no Brasil a apresentar um nova obra.

Em entrevista à nossa reportagem, Ângela revelou parte do seu percurso, o respeito que tem pela Suíça, o papel da literatura lusófona na Suíça e o carinho pela sua terra natal. Falou sobre projetos, explicou os seus livros e referiu como destina parte do seu tempo a outras causas sociais e de apoio ao próximo.

Que livro foi apresentado no Brasil em dezembro?

Foi uma manhã de autógrafos da minha autobiografia “Filha do Nordeste Brasileiro”, que aconteceu na Livraria do Jardim, no Recife, estado de Pernambuco, Brasil.

Como explica a obra?

O título “Filha do Nordeste Brasileiro” já contém a síntese dos meus objetivos. A obra é uma narrativa em que, pela análise das experiências pessoais, tentei entender a mim mesma. Mas também percebi que as minhas situações e infortúnios ainda são comuns na atualidade, e pessoas do mundo inteiro, de alguma forma, poderiam se beneficiar delas. A obra possui tanto sentido autoterápico quanto inspiracional, trazendo esperança para aqueles que não acreditam no decurso da vida. A obra ajuda a ressignificar e superar o passado, tornar o presente feliz e projetar um futuro esperançoso.

Que outros livros tem publicados?

Tenho paixão pela escrita e comecei desde cedo. A obra “Filha do Nordeste Brasileiro” foi o meu primeiro livro lançado. O segundo, “Deserto do amor”, é um livro de poesias e fotografias do deserto de Israel, país pelo qual também tenho muita afeição e que muito me influenciou. O terceiro livro, lançado em julho de 2024, é um romance ficção inspirado no calor e na exuberância do Estado de Pernambuco, intitulado “Samantha”.

Que trabalho desempenha além da literatura?

Após o lançamento do livro, criei um projeto na Suíça chamado “Espaço Internacional da Mulher”, onde, juntamente com uma equipa, que continha advogadas, psicólogas, psicopedagogas, nutricionistas, sexólogas, doulas e outras especialidades, promovíamos lives para trazer e discutir informações do universo feminino, como o combate à violência sexual, doméstica, doenças sexualmente transmissíveis e muitos outros temas. Este projeto foi inspirado na ONG brasileira “Casa de Passagem”, e demos continuidade ao seu lema: “A informação salva vidas”. Este trabalho me rendeu prémios na Itália, Portugal e França, e também fui a vencedora do “Prémio Luiza Brunet de enfrentamento da violência contra a mulher na Europa” em 2022. Por causa da minha paixão pela arte, realizo também um trabalho nas redes sociais denominado “Mostra tua arte na Suíça”, onde exponho talentos artísticos brasileiros residentes ou não na Europa. Através de livres e entrevistas, procuro incentivar e expor a cultura de Pernambuco e brasileira para a Suíça.

Como a literatura entrou na sua vida?

Desde cedo eu sempre amei ler, embora venha de uma família iletrada. Eu amava ler para a minha mãe e para os vizinhos que também eram iletrados. Eu era membro da biblioteca da escola. No ensino secundário, gostava muito de participar das competições de leitura e também de escrever. Cada livro que lia me inspirava a escrever outro. Cecilia Meirelles era a minha musa inspiradora na adolescência, assim como Monteiro Lobato e Jorge Amado. Até pensei em escrever novelas, mas, por ser uma romancista nata, escrevi durante o ginásio cinco livros, carinhosamente datilografados pela bibliotecária da escola. Todos eles foram expostos e lidos; isto foi um grande incentivo que deixava a jovem Ângela muito feliz.

Apresenta os seus livros também na Suíça?

Muito pouco. Vendi bastante exemplares aqui, porém, tudo via Instagram. Nunca estive numa feira ou salão de livros para fins de venda. Já estive em lançamentos na Espanha, apresentei a minha história em alguns seminários e encaminho as pessoas ao link de compra.
A única feira que participei foi em Lisboa, no stand da Rede Sem Fronteiras. Foi uma experiência maravilhosa. Este ano pretendo ir ao salão do livro em Genebra.

Na sua opinião, como a literatura lusófona, em língua portuguesa, é vivenciada na Suíça?

Atualmente, tenho visto muito empenho e valorização. As organizações de salões de livros em Genebra têm reunido muitos autores brasileiros residentes na Suíça e em outros países da Europa. Estamos ganhando muitos leitores brasileiros aqui, pois eles aprendem, através da cultura europeia, a valorizar ainda mais a sua cultura e o seu idioma.

Como é ser uma escritora brasileira no país helvético?

A Suíça é um país maravilhoso, com os seus lagos azuis, alpes, montanhas e outras belezas naturais; este encanto tomou parte na construção das minhas obras, mas o Brasil é a minha raiz e principal fonte de inspiração. Tenho uma relação profunda e especial com a minha terra natal. Quanto às minhas obras, a Suíça ainda não as absorveu devidamente pela ausência de tradução para o alemão, mas a edição portuguesa teve uma boa recepção entre os meus conterrâneos.

Explique a sua experiência e participação na sessão especial da série documental, “Eu não desisto de você”, que aborda sobre a Casa de Passagem, ONG que acolhe comunidades carentes. Qual o seu envolvimento?

A advogada Ana Vasconcelos (1944-2009), ex-presidente da Casa de Passagem, é homenageada com a série biográfica “Eu não desisto de você”, composta por cinco episódios de 26 minutos, que será exibida pela TV Brasil (data indefinida). O documentário reconstrói a sua trajetória através dos testemunhos das ex-meninas moradoras de rua e de comunidades carentes do Recife que frequentaram, na década de 1990, a ONG Casa de Passagem. Eu fui uma das meninas carentes que participaram no Projeto AMI (Agentes Multiplicadores de Informações).

Como é a sua vida na Suíça?

A minha vida é simples: sou integrada ao País, me dedico à família, me sinto em casa aqui, sem esquecer as minhas origens. O frio até hoje me incomoda. Gosto do meu trabalho, sou feliz por ter uma família suíça que tem orgulho de mim e me incentiva.

Como é viver na Suíça?

Viver na Suíça é aprender a lidar com regras. Se você fala o idioma, tem facilidades para se adaptar ao país e às regras. Seja no ambiente familiar ou no ambiente de trabalho, gosto da maneira como as coisas funcionam por aqui.

Convive com a comunidade portuguesa ou brasileira na Suíça?

Tenho muitos conhecidos e amigos brasileiros aqui, mas eu tenho muitos amigos suíços também e, como trabalho num ambiente internacional, tenho colegas de toda a Europa.
Também participo de alguns eventos brasileiros.

Frequenta associações portuguesas ou brasileiras no país?

Eu sou uma pessoa que gosta de estar em casa, gosto de estar só. Aproveito o meu tempo de solitude para escrever e saio muito pouco. É por este motivo que não sou membro de nenhuma associação.

Com que frequência vai ao Brasil?

Isto é relativo. Não tenho frequência certa; às vezes vou em anos consecutivos, às vezes passo três anos sem ir. Já passei sete anos sem ir por depender de vários fatores.

O que a Suíça significa para si?

A Suíça significa muito para mim, é minha casa; é o lugar onde amadureci, me tornei mulher, esposa, mãe e escritora.

Como e por que foi viver nesse país?

Como viver na Suíça é seguir regras, o país torna-se pouco acessível. A maneira mais fácil é através do casamento, que não indico fazer por interesse. A vida já é muito difícil quando amamos, e sem amor, numa cultura diferente, tornar-se um fardo. Amo este país, mas não quero dizer que viver nele é somente felicidade. Quando achamos felicidade e paz em nós mesmos, seremos felizes em qualquer lugar.

O que espera do futuro?

Espero um futuro preferencialmente saudável, quero ser lida em vários idiomas, ter a minha autobiografia no cinema e mostrar a realidade de muitas mulheres nordestinas/brasileiras para o mundo. Desejo ampliar o projeto informativo para mulheres, fazer o que amo, estar com minha família, continuar escrevendo, aprendendo e viajando.

A língua é um problema?

Nunca foi. Sou muito comunicativa, embora o meu alemão não seja igual ao de um nativo. Não estudei alemão profundamente, mas fiz um curso de 6 meses em 1997 que me ajudou muito na minha comunicação. Entendo perfeitamente tanto o alemão quanto o suíço-alemão.

Que projetos tem pela frente?

Divulgar as minhas obras lançadas em 2024: “Samantha” e “Deserto do Amor”. Desejo terminar de escrever dois projetos, que estão em aberto, e encontrar sócios para o projeto Espaço Internacional da Mulher.

Quem é Ângela Brodbéck?

Ângela Brodbéck nasceu sob o sol e céu azul de Olinda, Pernambuco, e levou consigo, até os Alpes suíços, a essência das cores e sabores de sua terra natal. Há 29 anos, transformou o cenário de montanhas e neve em lar, tecendo uma vida repleta de sonhos realizados e histórias para contar. De família humilde, Ângela herdou da avó, uma mulher de espírito vigoroso, a paixão pelas artes e a resiliência diante da vida. Ainda menina, guiada por uma curiosidade insaciável e uma imaginação fértil, começou a preencher páginas com histórias, poesias e sonhos. No ambiente de sua escola, viu suas palavras tomarem forma em cinco livros, datilografados pela bibliotecária: um marco precoce de seu talento.

A sua trajetória profissional e pessoal é tão multifacetada quanto as suas inspirações literárias. De aprendiz de corte e costura à decoradora de eventos, passando pelo projeto AMI da ONG Casa de Passagem em Recife e por um curso prático para Catering Worker, Ângela sempre buscou superar os limites do possível. Hoje, divide o seu tempo entre a rotina no aeroporto de Zurique e o aconchego da sua família, composta pelo marido e três filhos, as suas maiores fontes de alegrias.

Influenciada por ícones como Frida Kahlo, Cecília Meireles, Jorge Amado, Anita Diamant e Napoleon Hill, Ângela tece em suas palavras um diálogo entre mundos, sensibilidades e lições. Sua escrita carrega em prosa a autenticidade das vivências, refletindo anseios e impressões da sua alma nordestina e a vastidão dos horizontes que cruzou. Com uma vida dedicada à busca da beleza nos detalhes e à construção de um legado literário, Ângela Brodbéck transforma experiências em arte e convida os seus leitores a se perderem nas páginas de suas histórias, tão ricas e envolventes quanto o percurso que a levou até aqui.

Recebi o troféu “Cultura Sem Fronteiras” pela Entidade Rede Sem Fronteiras, na categoria “Literatura”, em Lisboa – 2022, por mérito, reconhecimento e por promover o engrandecimento da cultura lusófona; Fui condecorada em 2022 com a Cruz do Reconhecimento Social e Cultural, recebendo o título de “Dama Comendadora” pela Câmara Brasileira de Cultura, em Campina Grande-PB-Brasil; Recebi o prémio “Luiza Brunet 2022 de combate à violência contra as mulheres”, organizado pela Revista High Profile (Londres-Inglaterra), que ocorreu na Torre Eiffel – Paris-França; Recebi o Prémio de Reconhecimento de Méritos no Evento Summi Estética em Málaga-Espanha em 2024; Recebi Moção de Aplauso como presidente da Associação Internacional da Mulher pela Câmara Municipal de Porto Velho em 2024.

Por fim, como vive o coração do imigrante na Suíça?

No meu caso, sou muito grata porque a Suíça entrou no momento certo na minha vida. Eu não a busquei, nem a desejei: ela simplesmente chegou até mim. Nunca tive a intenção de viver no estrangeiro e sofri muito com a falta da família. Os primeiros dois anos foram muito difíceis. Me adaptei, me familiarizei, mas sempre tive um grande amor pelo nordeste brasileiro, apesar de toda a dor que eu vivi no país; isso não diminuiu o meu amor pela família, nem deixei de ver a leveza natural do país, tampouco a alegria e a espontaneidade do seu povo. O meu coração é grato por todos os anos que vivi aqui na Suíça, onde as coisas realmente funcionam, porém, estudo a possibilidade de um dia voltar ao meu nordeste brasileiro. ■

 

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