O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, participou, na Quinta da Boa Vista, no Rio de Janeiro, na noite de 12 de setembro, na cerimónia de retorno do Manto Tupinambá ao Brasil, realizada no Museu Nacional, onde a peça ficará exposta. O momento ficou marcado pelo discurso da líder indígena Yakuy Tupinambá, que leu o Manifesto da Vigília ao Manto Sagrado Tupinambá e, durante algumas passagens, criticou duramente o presidente e o governo, chegando mesmo a questionar a aprovação, no ano passado, do Marco Temporal no Congresso Nacional.
No início do discurso, Yakuy reiterou a “insatisfação” do seu povo “com a postura colonizadora unificada pelo Estado brasileiro, através das autarquias representativas que, mais uma vez, dilaceram nossos direitos originários e, muito mais que isso, fere profundamente o que mais prezamos, a nossa crença e a nossa fé. Nosso desejo, principalmente dos nossos anciãos, era que, no desembarque do manto sagrado, pudéssemos estar presentes para recebê-los com os ritos honrosos merecidos por se tratar de algo, para nós, de extrema importância espiritual e de identidade cultural”.
Yakuy cobrou pelos direitos do seu povo e, numa leitura veemente, advertiu Lula sobre o Congresso Nacional, o judiciário e a imprensa.
“Temos hoje o pior congresso da história da República. Um judiciário egocêntrico e parcial. Um governo, senhor presidente, que nós entendemos o porquê, enfraquecido, acorrentado às alianças para se manter no poder. E ainda uma quantidade considerável de veículos de imprensa que fazem um papel sujo para o sistema dominante. Não respeitam as leis, nem os tratados e convenções internacionais. Vivemos uma democracia distorcida”, disse.
Por sua vez, o presidente brasileiro contestou a indígena.
“Eu vou voltar a Brasília. E, na semana que vem, eu vou conversar com o companheiro Lewandowski, ministro da Justiça e Segurança Pública. Quando o Marco Temporal voltou para a Suprema Corte nos criou uma dificuldade para fazer a desintrusão como a gente queria fazer e eu vou dizer que a gente pode fazer o possível e o impossível para que a gente possa, quem sabe, atender à grandiosidade desse manto sagrado e se a gente pode uma vez por todas fazer desintrusar as terras tupinambás”.
Minutos depois, Lula virou-se para Yakuy e a repreendeu.
“Eu queria apenas que a companheira que falou aqui mudasse o seu discurso. Aqui não tem subserviência para ficar no poder, eu não preciso disso. O que você tem é inteligência política para saber que eu tenho um partido com 70 deputados de 503 e 9 senadores de 81. Para eu aprovar as coisas, sou obrigado a conversar com quem não gosta de mim”, frisou.
Ainda durante o seu discurso, Yakuy mencionou que seu povo repudia todo tipo de intervenção repressora.
“Também reiteramos aqui as nossas reivindicações: retorno do manto para a aldeia Tupinambá de Olivença, construção do Museu de Arte Tupinambá. Exigimos o respeito e a garantia dos nossos direitos, estruturação e autonomia. Universidade dos povos indígenas. Reestruturação da FUNAI. Reparação aos povos indígenas e africanos. Não ao marco temporal. Demarcação já”, revelou.
O Tupinambá de Olivença, composto por 23 comunidades, aguarda “a vontade política desde 2009, para que seja assinada a portaria declaratória pelo Presidente da República e Ministro da Justiça”. Conforme a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), um pouco mais de “15 anos os 47 mil hectares das terras Tupinambá de Olivença foram delimitados. E a Terra Indígena Tupinambá de Belmonte, que soma 10 mil hectares, está delimitada desde 2013”, finalizou a indígena. ■